domingo, 27 de maio de 2007

Desencontro

Passei sem me notar
Não olhei querendo olhar
Fiz de conta não amar
Senti meus pés no chão
Passou sem se notar
Não falou querendo falar
Fez de conta não amar
Não ouviu o coração
Passaram sem se notar
Não amaram querendo amar
A rima muda para finalizar
O que foi dito até então


Fez-se de ambos alma triste e coração partido
Pois não só o tempo, que passou, foi perdido


By Tais Carla B. Cassemiro

quinta-feira, 17 de maio de 2007

O mundinho de Lisa

Lisa vivia num mundinho totalmente seu.
Nele não havia suco de limão sem açúcar, mosca na sopa, bichinho na goiaba e nem salada de jiló. Não havia hematomas, nem bicicleta sem rodinhas, nem casca de banana para escorregar. Não havia Frankstein, nem Drácula, nem Lobisomem muito menos Bicho-Papão dentro do armário. Não havia lagartas, somente borboletas. Não havia sapos, somente príncipes encantados. Não havia pesadelos, somente sonhos com carneirinhos pulando a cerca. Não havia o cachorro que acabava de rolar na lama e pulava em cima do colo, bem quando estava usando a roupa predileta. Não havia bola de chiclete que estourava e grudava no cabelo. Não havia meninos que detestavam meninas, nem meninas que se exibiam a cada roupa nova. Não havia bronca do pai ou castigo da mãe. Não havia aquela música que fazia chorar, nem aquela música que era horrível mas era a que ficava na cabeça o dia inteiro. Não havia beliscão, nem tapa, nem chute na bunda. Não havia guerra de travesseiro nem de comida. Não havia macarrão com bastante molho para se lambuzar, nem sorvete que derretia ou chocolate que caía na roupa. Não havia soluços tão intermináveis que era preciso tentar várias artimanhas para fazê-los parar e mesmo assim não paravam. Não havia irmão ou primo mais novo que mostrava a língua e puxava o cabelo. Não havia gripe que fazia o nariz escorrer e os olhos lacrimejarem. Não havia saudade pois todo mundo estava ali. Não havia espirros incessantes que fazia o nariz ficar parecido com um enorme morango. Não havia saia rasgada enquanto pulava a cerca tentando escapar do cachorro do dono do pé de jabuticaba. Aliás, nem havia pé de jabuticaba. Não havia dente mole para amarrar um barbante, prender na porta e esperar alguém abrir. Não havia programa de televisão idiota para mudar de canal. Não havia pernilongo que ficava cantando a noite toda no seu ouvido. Não havia ninguém tão mal capaz de explodir o seu mundinho perfeito.
Resumindo: o mundinho de Lisa era um tédio.
By Tais Carla B. C.

domingo, 13 de maio de 2007

Dois minutos

Estela acordou bem cedo, tomou banho para despertar, vestiu-se e partiu para mais um dia - sua vida era uma rotina. Desceu pelo elevador - morava no sétimo andar. Entre o quinto e quarto andares, um susto: o elevador parou. Olhou para o relógio: marcava 7:46h da manhã. O elevador voltou a funcionar, sentiu um alívio. Chegou ao térreo, cumprimentou o porteiro, entrou no carro e seguiu para o trabalho. Tinha que pegar a priminha - como prometera a tia - e levá-la à escola. Deixou a menina onde sempre deixava e finalmente foi trabalhar. Era secretária.
Mal sentou na cadeira, o telefone já tocou. Esse foi o primeiro de muitos. Fazia um ano que exercia essa função e o barulho dos telefones - haviam três - estava começando a abalar seus nervos. Seu chefe era um homem muito ansioso que exigia rapidez. Estela não tinha tempo nem para um cafezinho. Só descansava mesmo na hora do almoço - isso quando não tinha que fazer algo em algum lugar no “quinto-dos-infernos” para o “chefinho querido”. Dois minutos que ela pensava em parar, era um dia a mais que ela gastaria para fazer tudo o que tinha que fazer.
Fim do dia. Foi embora, pegou a priminha, levou-a para casa da tia e finalmente voltou para seu apartamento. Estacionou o carro na garagem do edifício, cumprimentou o porteiro, subiu pelo o elevador. Entre o quarto e quinto andares, outro susto: o elevador parou novamente. Voltou a funcionar. Estela notou que ele não mais subia e sim descia. Quando ela olhou no relógio, ainda era 7:48h da manhã. Apenas dois minutos haviam se passado. Ela ainda tinha um dia todo pela frente.


By tais Carla B. C.

domingo, 6 de maio de 2007

Sono de Inverno

É muito difícil - para não dizer impossível - saber o que se passa na cabeça de uma pessoa, mesmo ela sendo previsível.
Júlia não gostava do inverno desde que lhe haviam quebrado o coração.
Na primeira noite dessa estação fria, Julia conheceu Rômulo. Amor à primeira vista. Conforme os dias foram se passando, eles se conheceram melhor e ficaram mais íntimos. Pura ilusão. Antes mesmo que o inverno acabasse o amor de Rômulo por Julia chegou ao fim - talvez nunca tenha começado. Desde então, essa época do ano só trazia lembranças amargas a jovem garota.
Júlia resolveu excluir o inverno de sua vida. Sempre que se iniciasse essa estação ela dormiria um sono profundo.
Na primeira noite antes do inverno, ela se preparou para dormir. Dormiu tranquilamente, mas no outro dia, logo de manhã, já estava acordada. Passou o inverno todo frustrada e deprimida. Nas três estações que se seguiram ela tentou encontrar um modo de dormir intensamente. Tomou remédios, chás... enfim, tudo que achava que a manteria dormindo por um longo tempo.
Foram três invernos que ela sofreu, pois nada funcionava. Dormia uns dois dias seguidos, mas depois que acordava era mais dois que não conseguia dormir. Com a idéia fixa em sua cabeça, Julia foi ficando com os nervos abalados. Ficava horas no quarto sozinha. Mantinha distância de todos. Estava inacessível e mentalmente perturbada.
Um dia, enquanto observava o jardim de sua casa pela janela do quarto, sentiu um vento gélido sobrar anunciando a chegada do inverno. Teve uma idéia ao olhar para a lua.
Foi até a cozinha, no fundo do armário pegou o que precisava, encheu um copo com água e foi para o quarto a passos surdos. Vestiu a camisola que mais gostava, deitou-se na cama, ajeitou as cobertas, pegou o copo e bebeu. A expressão de seu rosto demonstrava o amargor. Recostou a cabeça no travesseiro, fechou os olhos. Em seu rosto havia a aparência de um desejado descanso. E finalmente Julia dormiu, não só naquele inverno mas também nos outros que se seguiram.


Tais Carla B. Cassemiro
- só para reforçar: todos os textos desse blog são de minha autoria